sábado, 30 de maio de 2020

CRÓNICA - O DIVINO ESPÍRITO

Quando termina o Domingo de Páscoa começa logo a azáfama para quem abrigou o Divino Espírito Santo em sua casa. Ele é o símbolo da paz e está representado de várias formas durante o ano inteiro: água benta, óleo, cruz, nuvem e pomba branca, porém nesta altura pascal é mais revelado como pomba e coroa de estanho de cor acinzentada.
Foi a Rainha Santa Isabel, na Vila de Alenquer, em Portugal Continental, que iniciou o culto ao Divino Espírito Santo para ajudar os mais necessitados com cozido à portuguesa e sopa de pão. Porém, tal tradição veio para o arquipélago açoreano com os povoadores. Começaram as Coroações devido à ocorrência de catástrofes vulcânicas.
Em décadas passadas o meu avô paterno apresentava um carro de bois no adro da igreja para a família passar o domingo.
Já participei em muitas Coroações do Divino Espírito Santo em várias freguesias da ilha e já levei diversos utensílios até à igreja. O meu pai costuma ser criador de bezerros para Funções/Coroações e eu já ajudei a tratar de alguns deles.
É de lamentar fazerem cada vez menos as típicas bezerradas como antigamente, está-se a deixar de fazer isso, a matança agora é no matadouro, mas muita gente ainda enfeita os vitelos junto de casa e realizam a folia e um jantar com muitos convidados. Porém vai-se evitando por causa do cansaço e azáfama por parte dos pagadores de promessas, alguns simplesmente dão o jantar aos criadores dos bezerros e sua família, dispensando a folia.
Ao chegar o Domingo de Pentecostes acontece habitualmente o primeiro Bodo no adro da igreja após a missa juntamente com a actuação da filarmónica é distribuído pão e vinho (e, por vezes, massa-sovada) aos presentes. Podem-se ver carros de toldos com inúmeras iguarias, onde as pessoas passam a tarde a petiscar, na algazarra e os mordomos fazem arrematações/leilões no edifício do Império do Divino Espírito Santo. No Domingo da Santíssima Trindade dá-se o mesmo acontecimento. É uma festa típica terceirense que eu estou habituada e que nunca falto, já estive no império a arranjar a mesa para os pagadores de promessas anuais e também já estive na dispensa e em carro de toldo.
A freguesia fulcral para tal tradição é a da Vila Nova, pertencente à zona do Ramo Grande, concelho da Praia da Vitória, onde se encontram dezenas de carros de toldo, ao que consta já chegaram aos cinquenta, pois o padroeiro é o Espírito Santo. Na Vila das Lajes também é habitual verem-se uns dez carrinhos de bois, é de igual modo uma freguesia forte para essa tradição. Na Agualva também aparecem carros de toldo, cerca de uma dezena. Em S. Brás e nas Fontinhas vêem-se menos carros de madeira, apenas um ou três. O Ramo Grande apresenta maior adesão de carros antigos (sem os bois) enfeitados, mas no Concelho de Angra do Heroísmo vêem-se alguns carros de toldo, principalmente na Vila de S. Sebastião.
Costumo ir correr os bodos e já petisquei em vários locais. Cada freguesia é diferente, embora pareça igual. É muito agradável passar a tarde de domingo no bodo seja com a coroação ou com o mordomo ou apenas para honrar a tradição. O ambiente é de festa e eu sou terceirense e gosto. Adoro os petiscos, seja em carro de bois, dispensa ou império. O que me falta fazer é ter o privilégio de fazer arrematações nos dois sentidos.

Sem comentários: