segunda-feira, 2 de abril de 2012

CONTO - DEPOIS DA TRAGÉDIA VEM A ESPERANÇA

Na semana que antecede a Páscoa estava tudo muito agitado na casa da família Aragão, pois a sua filha mais velha, Esmeralda, ia casar-se com Dionísio, um toureiro afamado. Os pais de ambos estavam agitados com os preparativos. Esmeralda já comprara o vestido de noiva e estava radiante com o seu casamento. Os padrinhos já haviam sido escolhidos, os convites entregues a tempo e os convidados já tinham avisado que iam. Contava-se com mais de cento e dez pessoas. Nada podia falhar!
Porém, na quarta-feira da semana santa, à tarde, houve um grave acidente na auto-estrada. Dionísio ia com uns amigos num dos carros que ficara amolgado e os seus ferimentos não eram ligeiros. As causas do acidente eram a velocidade excessiva e a estrada molhada.
Esmeralda só tivera conhecimento do facto uma hora mais tarde. Ficou em apuros e resmungou para a mãe:
– Não acredito no que me está a acontecer! Por que é que tinha que ser logo agora?
– Minha filha, o que aconteceu?
– O Dionísio teve um acidente de automóvel com uns amigos… Sempre temi o touro e afinal, ele nunca nos prejudicou, bastou um simples acidente para estragar tudo.
– Não tires conclusões precipitadas… O casamento ainda não está estragado. Não agoires. Não sabemos se os ferimentos são muito graves.
– Quando me ligaram do hospital disseram-me que os ferimentos não eram leves, portanto, temo pelo meu casamento. Não quero pensar nisso, mas quase que sou obrigada.
– Não fiques assim. – Consolou a mãe.
No dia seguinte à tarde Esmeralda foi até ao hospital ver o seu amado. Ele estava inconsciente, mas deixaram-na entrar no quarto e dar-lhe a mão. Teve vontade de chorar ao vê-lo naquele estado. Quando saiu perguntara a um dos médicos que o assistiu quantos dias ele poderia ficar desacordado. Eles não lhe deram resposta certa:
– Depende. Ele levou uma pancada na cabeça, tem um traumatismo craniano. Não é o caso mais grave, e isso deveu-se ao atendimento da equipe hospitalar no local do acidente. Nestes casos, considerados moderados, ele pode vir a ter dificuldade em se movimentar ou em comunicar. Mas como lhe disse: depende.
– Demora mais do que uma semana?
– Não lhe sei dizer ao certo. Não fique ansiosa, minha senhora. Relaxe e pense que o pior já passou. Agora é tudo uma questão de tempo. – E, dito isso, foi-se embora.
Esmeralda veio para casa de táxi e durante todo o caminho rezou para que o seu amado melhorasse o mais rápido possível, porque queria muito casar-se.
Todos os dias Esmeralda ia visitar o seu amado na esperança que ele lhe desse um sinal de melhoras. No dia anterior ao de Páscoa, ele abriu os olhos na altura em que ela lhe tinha ido visitar e olhou-a. Esmeralda encheu-se de felicidade e já sem pensar nos seus ferimentos não se conteve e abraçou-o, de lágrimas nos olhos. Então, pegando-lhe na mão e olhando bem nos olhos de Dionísio disse:
– O nosso casamento, que estava marcado para amanhã, foi cancelado. Já avisei todos os convidados. Lamentaram e prometeram vir-te visitar. Marcaremos nova data depois de estares curado.
Então ela viu que dos seus olhos caiam lágrimas e emocionou-se:
– Não quero que chores nem que sofras mais do que já sofreste nestes últimos dias.
Ele abriu a boca para tentar dizer alguma coisa, mas não conseguia. E ela viu que o seu sangue batia mais forte nas veias e que a mão dele apertava a sua. Dionísio queria dizer-lhe qualquer coisa, mas não podia.
– Não te esforces. Tenta descansar. – E levantou-se – E não te preocupes que volto amanhã e todos mais dias que aqui estiveres. – E beijou-lhe a mão saindo de seguida.
Informou os médicos do que sucedera e um deles disse:
– Como viu, disse-lhe a verdade, o caso do seu namorado não era grave e não tinha que se preocupar. Se ele continuar a progredir não tarda a ter alta e a voltar para casa.
Quando entrou em casa, já era o final do dia, deu as boas novas à mãe dizendo:
– Estou muito contente com as melhoras do Dionísio. Apesar de não nos casarmos no dia de Páscoa eu fiquei a saber qual era o verdadeiro espírito deste acontecimento que se celebra todos os anos. Existem milagres e ressurreições, todos os dias e a todas as horas.
– Mas o Dionísio não ressuscitou, ele não estava morto.
– Quando o vi naquela cama do hospital tão enfermo não acreditei nas palavras do médico: que não era grave e que ia melhorar; pensei que ele ia morrer mais cedo ou mais tarde e que o doutor me queria poupar. Foi então que me voltei para a oração, pedindo ajuda dos Céus, talvez a transcendência pudesse actuar. Quando me dei conta do começo das melhoras dele, hoje quando o fui visitar, passei a acreditar nas palavras do médico e na ressurreição, não só dos mortos, mas também dos doentes. Porque o estado dele, inconsciente, para mim, era a morte a chegar. Porém, ele já despertou do seu sono e este ano, na Páscoa, haverá ressurreição à séria, pois eu também senti o meu coração ressuscitar, tornar-se mais optimista e com mais amor, não só às pessoas, mas a Deus Nosso Senhor.
– Minha filha! – Exclamou a mãe abraçando-a – Estou muito contente por te sentires renovada e com mais fé. Por vezes há males que vêm por bem. Deus sabe sempre o que faz, por isso, tenho a certeza, que este ano, a Páscoa será diferente para todos nós da família.
– Só tenho pena de o Dionísio ainda estar no hospital. – Lamentou Esmeralda cabisbaixa.
– Não fiques triste, minha querida! – E abraçou-a – Vamos avisar a família dele e amanhã, à tarde, iremos todos juntos visitá-lo e passar o resto do dia de Páscoa junto dele.
Ao ouvir a mãe dizer tais coisas conseguiu sorrir novamente.
No dia seguinte foram todos para o hospital. A princípio os médicos não queriam deixar entrar tanta gente no quarto do paciente, mas Esmeralda insistiu tanto que o médico acabou por consentir:
– Visto que hoje é dia de Páscoa, podem entrar; mas com uma condição: uma enfermeira vos acompanhará e ficará lá durante a vossa visita.
Todos aceitaram e lá foram na direcção ao quarto. Esmeralda foi a primeira a entrar.
Dionísio já estava sentado, encostado à barra da cama, com uma pilha de almofadas atrás de si. Ao ver a família chegar sorriu-lhes. A namorada foi para junto dele e deu-lhe a mão, sentando-se a seu lado dizendo-lhe:
– Como vês estou junto de ti, tal como te prometi. E trouxe a nossa família mais chegada para passarem esta tarde, do dia da Festa da Ressurreição, contigo. Então, Dionísio abriu os lábios e começou por dizer:
– Esme…ral…da.
– Dionísio! – Exclamou de felicidade, deixando um sorriso sair dos seus lábios – Falaste.
– Des…cul…pa.
– Desculpa de quê?
– Por ter ti...do o aci…den…te.
– Esquece. Não tiveste a culpa de nada. E aliás, o importante é estarmos juntos hoje. Não importa onde seja. Eu tenho é que te agradecer... Sei que é talvez desapropriado o que eu vou dizer, mas… – E sorriu, baixando a cabeça.
– Diz.
Então, encarou-o e disse:
– Esta desgraça serviu para nos aproximar cada vez mais e para nos unir a Deus. Tenho a certeza que as tuas rápidas melhoras tiveram muito a mão de Deus.
– Mas e o… casa…men…to?
– Fica para depois; por que eu acredito que os sentimentos, com o tempo, não se desgastam, muito pelo contrário: crescem e se fortificam cada vez mais.